UNIÃO FEDERAL PUBLICA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.152/22 E ALTERA AS NORMAS SOBRE O “PREÇO DE TRANSFERÊNCIA”

Desde 1º de janeiro de 2023 os contribuintes que realizem transações com partes relacionadas situadas no exterior podem optar pela aplicação das novas regras de preços de transferência previstas pela Medida Provisória nº 1.152/2022. Há mais de 10 anos as regras dos Preços de Transferência não sofriam qualquer reforma.

Conforme se explica a seguir, a MP n° 1.152/22, publicada em 29 de dezembro de 2022, adveio de uma ação entre a Receita Federal e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) visando a harmonização da legislação brasileira ao padrão das normas internacionais sobre o preço de transferência.

  1. histórico da adesão do brasil à ocde – cumprimento de requisitos exigido pela organização

Em maio de 2017, o Brasil formalizou pedido de adesão à OCDE, buscando, principalmente, estabelecer um clima atraente para investidores internacionais e de maior confiança nas instituições brasileiras. Contudo, foram requisitadas pela organização internacional uma série de adequações, em especial algumas questões tributárias.

A recente Medida Provisória n.º 1.152/2022 é, neste contexto, uma resposta do Brasil às Diretrizes de Preços de Transferência da OCDE para empresa multinacionais e administrações tributárias. Segundo estabelece a própria organização, preços de transferência correspondem ao valor pelo qual uma empresa transfere bens físicos e propriedade intangível ou fornece serviços a empresas associadas (ou partes relacionadas) situadas em outros países.

Neste contexto, “partes relacionadas” são empresas cujas operações são marcadas pela influência de uma sobre a outra, como ocorre no caso de multinacionais ou de uma empresa controladora e suas controladas.

Portanto, as normas atinentes ao preço de transferência visam evitar a evasão fiscal pelas empresas brasileiras que possuam matriz, filiais, empresa controlada/controladora ou coligada situada fora do território nacional – o que se operacionaliza por meio da aferição de referibilidade entre o valor da transação desenvolvida e o valor de mercado do bem/direito comercializado.

Até então, as normativas brasileiras divergiam das diretrizes traçadas pela OCDE, pois procediam com a fixação de um preço válido fiscalmente para a determinação da base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL, em prejuízo das condições reais de mercado. Tal situação foi alterada pela MP nº 1.152/2022.

  • especificidade das alterações promovidas pela mp Nº 1.152/2022

A MP n.º 1.152/2022 altera especificamente as normas que tratam da apuração da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) pelas pessoas jurídicas sediadas no Brasil que realizem transações controladas pelo preço de transferência, sejam estas operações comerciais ou financeiras, com partes relacionadas situadas no exterior.

  • Aplicação do Princípio Arm’s Length

Uma das principais alterações sugeridas pela OCDE à legislação brasileira e adotadas pela MP nº 1.152/2022 foi a adoção de normas compatíveis com o padrão arm’s length, princípio fundamental da tributação internacional por meio do qual se exige que as empresas operem entre si como entidades separadas, em condições de mercado e sem influência do vínculo existente em razão de estarem no mesmo grupo multinacional.

Para determinar se os termos estabelecidos nesta operação controlada estão de acordo com este princípio, a operação desenvolvida pelas partes relacionadas deve ser delineada de acordo com os parâmetros contratuais médios que seriam estabelecidos entre terceiros – conforme evidenciam os artigos 7º a 10 da MP nº 1.152/2022.

Com base nas diretrizes da OCDE, o contribuinte pode fazer a escolha pelo método de aferição de preço de transferência que lhe forneça a determinação mais confiável dos termos e das condições que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em uma operação comparável, dentre aqueles trazidos pelo art. 11 da MP nº 1.152/2022.

Assim, não mais ocorre a opção de apenas um método de cálculo de preço de transferência para todo o ano-calendário, como estabelecia a Lei nº 12.715/2012, devendo o método de cálculo elegido ser o mais adequado à operação de forma específica e individualizada.

O contribuinte apresentará a documentação e fornecera as informações necessárias para demonstrar que a Base de Cálculo do IRPJ e da CSLL relativa às suas operações controladas pelas normas de preço de transferência está de acordo com o princípio arm’s length, sob pena de arbitramento do preço de transferência pela própria Receita Federal do Brasil (art. 35, §1º).

  • Ampliação do Escopo Material do Controle de Preços de Transferência

Outra das principais alterações sugeridas pela OCDE ao Brasil em suas normas de preço de transferência foi a ampliação do escopo material do controle de preços de transferência para abranger os valores relativos às remessas de royalties ao exterior, bem como os pagamentos por serviços de assistência técnica, cientifica e administrativa a não residentes.

Tal recomendação foi completamente acatada pelo Brasil, pelo que a MP nº 1.152/2022 prevê em seu art. 45 hipóteses nas quais não é possível deduzir, na determinação do Lucro Real e da Base de Cálculo da CSLL, os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a título de royalties e assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante, a entidades em países com tributação favorecida ou a partes relacionadas.

A alteração legislativa, neste ponto, mostra-se prejudicial às empresas pois um maior número de operações passa a ser tributável pelo IRPJ e pela CSLL, aumentando a carga tributária paga pelo contribuinte na operação.

  • Prognósticos de Especialistas

Alguns especialistas indicam que o Brasil, como todos os países em desenvolvimento, enfrentará algumas dificuldades na aplicação das regras baseadas nas guidelines da OCDE. Entende-se que o maior obstáculo a ser enfrentado será encontrar dados de comparabilidade específicos e consistentes para que seja possível aplicar as normas trazidas pela Medida Provisória, uma vez que nos países da América Latina não há exigência de publicidade destas informações.

Uma das soluções apontadas, neste interim, é a imprescindível criação de um canal de comunicação entre a Receita Federal do Brasil e os contribuintes, uma vez que a Autarquia possui informações extremamente ricas acerca dos contribuintes, sejam estas oriundas do SPED, do SICOMEX ou mesmo do SISCOSERV (atualmente descontinuado pela União).

Contudo, em razão das incertezas acerca da implementação da Medida Provisória nº 1.152/2022, deve-se aguardar a regulamentação pela Receita Federal do Brasil das normas estabelecidas.

  • Vigência e Prazos para Tramitação perante o Congresso Nacional

Estabelece o art. 48 que a MP nº 1.152/2022 entra em vigor em 1º de janeiro de 2024. Contudo, o contribuinte pode optar pela aplicação das disposições estabelecidas pela MP para o ano-calendário de 2023, sendo a opção irretratável e acarretará a observância das alterações a partir de 1º de janeiro de 2023. Assim, a MP entra em vigor a partir de 1º de janeiro de 2023 para os contribuintes que fizerem a opção e a partir de 1º de janeiro de 2024 para os demais. Destaca-se, contudo, que o Congresso Nacional tem até 03/02/2023 para realizar emendas na legislação.

Autores: Daniel Melo, Kayo Sampaio e Marilise Frota

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